O Verbo de Deus incorpóreo, incorruptível, imaterial veio a nossa terra, embora dela não estivesse longe anteriormente (Cf. At 17, 27). De fato, ele não abandonou parte alguma da criação, mas, ao mesmo tempo, tudo enchia, permanecendo, contudo, unido ao Pai (Cf. Ef 4, 6-10). Entretanto, ele veio a nós por condescendência, favorecendo-nos com sua filantropia e manifestação.
Vendo que o gênero humano racional se perdia, e a corrupção da morte reinava sobre ele; vendo, ainda, que a ameaça de Deus contra a transgressão conservava toda a força da corrupção contra nós, e seria inconveniente que fosse a lei abolida, antes de se ter cumprido a sua ordem; vendo ser inadequado destruir a obra que ele mesmo havia criado, como demiurgo e arquiteto; vendo a maldade dos homens se tornar excessiva, e pouco a pouco ir aumentando, contra eles próprios, até se fazer intolerável; vendo todos os homens sujeitos à morte; e, finalmente, diante de tudo isto que seus olhos viam, ele teve piedade de nossa raça, e misericórdia de nossa fraqueza. Condescendeu, então, com nossa corrupção e não suportou que a morte dominasse sobre nós; a fim de não perecer a criatura, nem se inutilizar a obra realizada por seu Pai, em benefício dos homens. O Verbo tomou, por isso , um corpo igual ao nosso!
Pois, não quis apenas estar num corpo, nem quis somente aparecer. Efetivamente, teria podido, se quisesse, apenas aparecer, ou realizar esta teofania através de um ser mais poderoso que o homem. Assumiu, no entanto, um corpo como o nosso e não o fez simplesmente, mas o quis nascendo de uma virgem sem pecado, imaculada e intacta. Era puro o corpo, inteiramente alheio a qualquer união humana (Cf. 1Pd 1, 18).Sendo poderoso e demiurgo do universo, edificou para si, no seio da Virgem, um corpo, e fez ali morada como num templo (Cf. Hb 9, 24).
E assim, de algo que era nosso, tomou um corpo semelhante ao nosso, e como todos estamos sujeitos à corrupção da morte, ele o entregou à morte, em prol de todos, apresentando-o ao Pai. Agiu desta maneira por filantropia! Desta maneira, uma vez que todos nele morrem, a sentença de corrupção proferida contra os homens será abrogada, após ter sido inteiramente consumada no corpo do Senhor. De agora em diante, a corrupção da morte não mais maltratará os homens, seus semelhantes. Ele reconduzirá à incorruptibilidade os homens que se haviam voltado à corrupção, vivificá-los-á, tirando-os da morte. Pela apropriação de um corpo humano, e pela graça da ressurreição, fará desaparecer, longe deles, a corrupção da morte que os atormentava, qual palha no fogo.
Santo Atanásio, Bispo e Padre da Igreja, (295-373), A encarnação do Verbo, São Paulo: Paulus, 2002. (II, 8, 1-4) p. 134-135.
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